terça-feira, 17 de novembro de 2009

Os discuros diversos

Desde que a iconoclastia pairou sobre a humanidade, tudo tem experimentado o sabor da incerteza. Os cânones do passado não foram de todo esquecidos e, no entanto, figuram como ruínas que, no mais, contam algo do que já foi e sua influência pulverizada no presente. E no centro de todas essas transformações está o indivíduo frente a uma sociedade complexa, coercitiva diante da competição entre seus pares e amorfa no que concerne aos mecanismos supra-individuais, aqueles que colocam os grupos sociais diante das mesmas preocupações e desafios.
À frente desse quadro, vigoram os discursos mais variados, diversos: religião, ciência, ceticismo etc., disputam a opinião das pessoas, formando um imaginário social cada vez mais multifacetado. Um mesmo indivíduo, atualmente, professa as mais díspares crenças: é cristão, mas tem inconscientemente o lema da competição porque precisa ser o melhor no mercado de trabalho...
No que diz respeito ao papel da ciência, já que a nossa sociedade a tem como oráculo das nossas vicissitudes, os doutos debatem entre si e de suas descobertas parecem sobressair as dissidências (é fundamental à ciência discordar, problematizar e, por fim, criticar): no lugar das velhas práticas, uma postura é requerida, só que parece tanto fazer existir como não existir... O que se problematiza aqui é aquilo que os discursos têm suscitado: eles parecem não procurar um ponto de convergência para que certos cânones sejam estabelecidos como pontos de partida para as ações humanas. Parece que a velha arenga, a discussão pela discussão, é o que predomina.
Os discursos científicos não têm necessidade de encontrar um problema comum através do qual as diversas vozes lançariam suas descobertas e previsões, mas supõe-se que os diversos problemas de nossa sociedade deveriam ser discutidos a partir de valores comuns entre aqueles que problematizam as relações humanas para que estas não sejam apreendidas pelo prisma da dissidência entre os indivíduos: o que importa é que certos valores devem ser transmitidos conjuntamente para que o imaginário social seja recriado na direção contrária à do atual momento de ausência de valores comuns.
Pois diversos são os problemas de nossa sociedade, alguns mais graves: meio ambiente, talvez o mais urgente, violência e depressão, são problemas que denotam a ausência de uma postura individual que reverbere ações coletivas; por isso, se é a ciência a grande voz da atualidade, seus discursos devem ser entremeados por valores convergentes, singulares em suas proposições para que congreguem os indivíduos em perspectivas coletivas. Não menos importante nessa postura é o posicionamento de cada indivíduo: já que a humanidade atingiu certo grau de discernimento, cada um deve ter uma postura tal que suas ações canalizem interesses mais abrangentes. É uma forma de viabilizar a construção de um imaginário social mais solidário...
Como metáfora do que foi dito, deixo como sugestão de leitura o subtítulo “A Ceia” da novela Zadig do filósofo Voltaire.

Um comentário:

Joseph K. disse...

É meu amigo... Pobre de nós que achamos ter em mãos as ferramentas que apertam os parafusos certos. A ciência que desenvolvemos parece mais uma cruz que temos que carregar do que as resposta para nossas perguntas. Lembra do mito de Tântalo? Pois é...